quinta-feira, agosto 30, 2007

Intermitente

O mundo é enorme sem toda a culpa que eu carrego por não ser a menininha leve e sem preconceitos que curte ver o desenho da Lua no mar e não se abala com tanto amor e nem com o medo e o cansaço que viver causa.

O mundo é cheio de opções sem você, mas todas elas me cheiram azedas e murchas demais.

(...) que você poderia simplesmente abaixar meu som ou mudar de canal, como um programa chato qualquer que passa na sua tv.

Estar sozinha não muda nada, conheço bem esse estado e, de verdade, sei lidar até melhor com ele. O que me entristece, é ter visto em você o fim de uma história contada sempre com a mesma intensidade individual.

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Foi tudo muito rápido entre a emoção do vôo e o batuque definitivo, e destoante da entrega pura, no chão.
Foi tempo suficiente para eu olhar o mundo sem a intenção da perfeição e sem o peso do próximo minuto. Viver nunca durou tanto.

Quis falar com alguém, mas quem?

Mas nunca mais receberia prêmios: ver você tão menino fazendo brincadeiras bobas, ver você dormindo.

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O problema é que não soube substituir o meu deslumbre por acomodação, eu não sei me conformar com a chatice do mundo. Mas o que exatamente seria uma vida extraordinária?

Nas poucas vezes em que senti algo realmente extraordinário, ou eu estava brincando de não ser eu, ou estava fazendo algo errado, ou estava vivendo algo que acabaria rápido e que jamais seria contaminado pelo tédio.

Viver extraordinariamente é isso então? É estar fora da nossa própria vida? É viver pouco várias coisas? É viver muito poucas coisas? É ser um personagem de um roteiro que a gente muda toda hora?

A lógica sempre ataca nossos instintos e transforma desejos em elaboradas impossibilidades. Queria apenas ir ser selvagem como diz aquele poema do Fernando Pessoa, ir ser selvagem apenas(...)

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Mas a verdade é que eu odeio o equilíbrio. Porra, se eu tô puta, eu tô puta!
Se eu tô com ciúme, não vou sorrir amarelo e mostrar controle porque preciso parecer forte e bem resolvida.

Eu não tô a fim de contar até 100, eu quero espancar a porta do elevador se ele demorar mais dois segundos,

quero morder o puto do meu namorado que apenas sorri seguro enquanto eu me desfaço em desesperos porque amar dói pra caralho...

Grande merda de vida, você muda a estação do rádio para não reparar que a menina de dez anos parada ao lado do seu carro, já tem malícia, mas não tem sapatos. Você dá mais um gole no frisante para não reparar que a moça da mesa ao lado gostou do seu namorado, e ele, como qualquer imperfeito ser humano normal, gostou dela ter gostado.

Você disfarça, a vida toda você disfarça.

Para não parecer fraco, para não parecer louco, para não aparecer demais e poder ser alvo de crítica, para ter com quem comer pizza no domingo, para ter com quem trepar na sexta à noite, para ter quem te pague a roupa nova e te faça sentir um bosta e para quem te pede socorro, você disfarça cegueira.

Você passa a vida cego para poder viver.

Você aceitou tudo, você trocou as incertezas da sua alma pelas incertezas da moça da novela, porque ver os problemas em outros seres irreais é muito mais fácil e leve, além do que, novela dá sono e você não morre de insônia antes de dormir (porque antes de dormir é a hora perfeita para sentir o soco no estômago).

Você aceita a vida, porque é o que a gente acaba fazendo para não se matar ou não matar todos os imbecis que escutam você reclamar horas sem fim das incertezas do mundo e respondem sem maiores profundidades: relaaaaaaaaaaaaaxa!

Eu não vou relaxaaaaaaaaaaaaaaaaaar.

A única verdade que me cala um pouco e, vez ou outra, me transforma em alguém estupidamente normal é que virar um louco selvagem que fala o que pensa, sem amigos e sem namorados, só é legal se você tiver alguém pra contar o quanto você é foda no final do dia.

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Você sabia melhor do que ninguém que a felicidade me esmagava e eu ficava ainda mais carente quando ganhava carinho. Por isso você era em doses homeopáticas a pessoa mais carinhosa do mundo e também o ser mais frio do planeta. Muito em pouco, o máximo no mínimo, quase nunca pra sempre, nunca mais todos os dias.

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