sexta-feira, junho 29, 2007

Saudade tonta...

Tudo Pela Metade
Marisa Monte E Nando Reis

Eu admiro o que não presta
Eu escravizo quem eu gosto
Eu não entendo.
Eu trago o lixo para dentro
Eu abro a porta para estranhos
Eu cumprimento.

Eu quero aquilo que não tenho
Eu tenho tanto a fazer
Eu faço tudo pela metade.
Eu não não percebo.
Eu falo muito mal.
Eu falo muito.
Eu falo mesmo.
Eu falo sem saber o que estou falando.
Eu falo muito bem.
Eu minto

quarta-feira, junho 27, 2007

Realidade...

Minha coragem foi a de um sonâmbulo que simplesmente vai.
Durante as horas de perdição tive a coragem de não compor nem organizar.
E sobretudo a de não prever.
Até então eu não tivera a coragem de me deixar guiar pelo que não conheço e em direção ao que não conheço.

Dar a mão a alguém sempre foi o que esperei da alegria.
Só o amor de todo o universo por mim poderia me consolar...

Criar não é imaginação, é correr o grande risco de se ter a realidade

Clarice Lispector

Devora-me ou te decifro

O tipo de beleza mais nobre é aquele que não arrebata de repente, que não faz ataques impetuosos e inebriantes (esse provoca com facilidade o tédio), mas que se insinua lentamente, que se carrega consigo quase sem saber e que um dia, em sonho, se redescobre, mas que, por fim, após ter ficado modestamente em nosso coração, toma posse completa de nós, enche nosso coração de desejo.

Nieztsche

No súbito brotar...

O artista sabe que sua obra só produz pleno efeito se fizer crer numa improvisação, numa miraculosa instantaneidade de criação; por isso ele alimenta de bom grado essa ilusão e introduz a arte, no começo de sua criação, aqueles elementos de entusiasta inquietação, de desordem que tateia às cegas, de sonho vigilante, como forma de iludir, a fim de dispor a alma do espectador ou do ouvinte, de tal modo a que ele creia no súbito brotar do perfeito.

Nieztsche

Vulcão...

Porque metade de mim é o que eu grito, mas a outra metade é silêncio.
Porque metade de mim é partida e a outra metade é saudade.
Que as palavras que eu falo não sejam ouvidas como prece nem repetidas com fervor, Apenas respeitadas como a única coisa que resta a um homem inundado de sentimento. Porque metade de mim é o que eu ouço, mas a outra metade é o que calo.
Que essa minha vontade de ir embora se transforme na calma e na paz que eu mereço, Porque metade de mim é o que eu penso e a outra metade é um vulcão.
Porque metade de mim é abrigo, mas a outra metade é cansaço.
Porque metade de mim é a platéia e a outra metade, a canção.
E que minha loucura seja perdoada.
Porque metade de mim é amor e a outra metade... também."

Oswaldo Montenegro

sábado, junho 23, 2007

Impaciente

Sustentado com coisas inocentes e com pouco, pronto a voar e impaciente por tomar vôo: assim sou.

O amor- o amor a qualquer coisa- basta-lhe viver- é o perigo mais solitário. Na verdade, prestam-se ao riso a minha loucura e a minha modéstia no amor.

Onde todo o tempo me parecia uma deliciosa zombaria dos instantes, onde a necessidade era a mesma liberdade, que brincava satisfeita com o aguilhão dessa liberdade.

Falar é uma bela loucura: falando, baila o homem sobre todas as coisas.

"E que todo o dia em que não se haja dançado, pelo menos uma vez, seja para nós perdido! E toda a verdade que não traga ao menos um riso nos pareça verdade falsa."

Nieztsche- Assim falava Zaratrusta

quinta-feira, junho 21, 2007

Somos pássaro novo, longe do ninho...

- trechos da resposta de Freud para a carta de Einstein perguntando: Por que a Guerra?

Como o senhor vê, isso não é senão uma formulação teórica da universalmente conhecida oposição entre amor e ódio, que talvez possa ter alguma relação básica com a polaridade entre atração e repulsão, que desempenha um papel importante na sua área de conhecimentos. Entretanto, não devemos ser demasiado apressados em introduzir juízos éticos de bem e mal. Nenhum desses dois instintos é menos essencial do que o outro; os fênomenos da vida surgem da ação confluente ou mutuamente contrária de ambos. (...)A dificuldade de isolar as duas espécies de instinto em suas manifestações reais é, na verdade, o que até agora nos impedia de reconhecê-los.

De forma que, quando incitados à guerra, as pessoas podem ter todo uma gama de motivos para se deixarem levar- uns nobres, outros vis, alguns francamente declarados, outros jamais mencionados. Não há por que enumerá-los todos. Entre eles está certamente a agressividade: as incontáveis crueldades que encontramos na história e em noissa vida de todos os dias atestam a sua existência e a sua força.

No caso do homem, sem dúvida ocorrem também conflitos de opinião que podem chegar a mais raras nuanças da abstração e que parecem exigir alguma outra técnica para sua solução.

As idéias a que se faz o apelo só podem, naturalmente, ter importância se exprimirem afinidades importantes entre os membros, e pode-se perguntar quanta força essas ideías podem exercer. A história nos ensina que, em certa medida, elas foram eficazes.

segunda-feira, junho 18, 2007

Greve- Resumo.

A Universidade já está sob tutela, já estava sob tutela sem os decretos.
As leis pioram a situação.
Na verdade a gente quer resistir.
A desordem não é para construir a universidade que a gente sonha, mas para resistir à uma destruição.
(Trecho do Grupo de Discussão sobre a Universidade Brasileira.)

1- “Por uma educação de qualidade”... Mas, no fim, o que é educação??

Quando observamos a quantidade e a variedade dos estabelecimentos de ensino e de aprendizado, assim como o grande número de alunos e professores, é possível acreditar que a espécie humana dá muita importância à instrução e à verdade. Entretanto, nesse caso, as aparências enganam.(...)
A maior parte de todo o saber humano em cada um dos seus gêneros, existe apenas no papel, nos livros, nessa memória de papel da humanidade. Apenas uma pequena parte está realmente viva, a cada momento dado, nas pessoas.
(Schopenhauer- A arte de Escrever.)

2. Então como estamos sendo educados?

Com o declínio da consciência, com o controle da informação, com a absorção do indivíduo na comunicação em massa, o conhecimento é administrado e condicionado.
O indivíduo não sabe realmente o que se passa; a máquina esmagadora de educação e entretenimento une-o a todos os outros indivíduos, num estado de anestesia do qual todas as idéias nocivas tendem a ser excluídas.
E como o conhecimento da verdade completa dificilmente conduz à felicidade, essa anestesia geral torna os indivíduos felizes.

O impulso agressivo mergulha no vácuo- melhor, o ódio encontra-se com sorridentes colegas, atarefados concorrentes, funcionários obedientes, prestimosos trabalhadores sociais, que estão todos cumprindo seus deveres e são todos vítimas inocentes.

A eliminação das potencialidades humanas do mundo de trabalho cria as precondições para a eliminação do trabalho do mundo das potencialidades humanas.
(Marcuse- Eros e Civilização.)

A educação seria impotente e ideológica se ignorasse o objetivo de adaptação e não preparasse os homens para se orientarem no mundo. Porém ela seria igualmente questionável se ficasse nisto, produzindo nada além de well adjusted people, pessoas bem ajustadas, em conseqüência do que a situação existente se impõe precisamente no que tem de pior. (Adorno)

3. Mas podemos fazer algo com relação a isso?

O mito do receptor passivo: A idéia de que os receptores das mensagens da mídia são espectadores passivos, que simplesmente absorvem o que se passa diante deles na tela ou o que está presente no papel, é um mito que não se coaduna com o caráter atual de apropriação como um processo contínuo de interpretação, de discussão, apreciação e incorporação.

‘A sociedade moderna se tornou uma enorme e muito bem lubrificada máquina onde os indívduos não são mais que partes funcionais.’
Não é absolutamente claro que todos, ou mesmo a maioria, os indivíduos das sociedades industriais modernas estejam nitidamente integrados na ordem social, que suas faculdades intelectuais estejam tão profundamente embotadas a tal ponto que eles não sejam mais capazes de ter um pensamento crítico e independente.
(Ideologia e Cultura Moderna- Jonh B. Thompson)

O outro é real. O resto é abstração. Você faz o que quiser com a imaginação. Mas o outro você não pode imaginar. Ele está sempre a mais ou a menos. Atrapalha. Só que o outro não pode deixar de ser verdade.
Não há alternativa. Nós nos acostumamos a atropelar o próximo como se ele nada fosse, em nome desse ou daquele ponto de vista, que na verdade não é outra coisa se não um ponto de vista.
(Bruno Tolentino)

4. Por que não agimos, não participamos?

A disciplina “fabrica” indivíduos; ela é a técnica específica de um poder que toma os indivíduos ao mesmo tempo como objetos e como instrumentos de seu exercício.
Não é um poder triunfante que, a partir de seu próprio excesso, pode-se fiar em seu superpoderio; é um poder modesto, desconfiado, que funciona a partir de uma economia calculada, mas permanente.
(Foucault, Vigiar e Punir).

Uma eleição nacional é, realmente, uma disputa importante? Importa, realmente, quem ganha? As plataformas das duas partes são cuidadosamente elaboradas e tão semelhantes quanto possível, e quando a eleição acaba, somos exortados a aceitar o resultado como bons esportitas. Apenas alguns eleitores continuam se incomodando muito depois de uma semana ou duas. O resto sabe que não há perigo real. As coisas continuarão como antes.
Votar é um meio de pôr a culpa no povo pela situação. O povo não faz regras, é o bode expiatório.
(Skinner, Waden II )

5. Qual a importância de nos unirmos e nos organizarmos ?

O fato de haverem sido transformados num grupo os faz sentir, pensar e agir de maneira muito diferente daquela pela qual cada membro dele, tomado indivualmente, sentiria, pensaria e agiria, caso se encontrasse em estado de isolamento.
Há certas idéias e sentimentos que não surgem ou que não se transformam em atos, exceto no caso de indivíduos que se transformam num grupo. (...)
O indivíduo que faz parte de um grupo adquire por considerações numéricas, um sentimento de poder invencível que lhe permite render-se a instintos que, se estivesse ele sozinho, teria mantido sob coerçao.
(Sigmund Freud- Psicologia de Grupo e Análise do Ego.)

sexta-feira, junho 15, 2007

rascunhos de 2004 e coincidências

De você só posso ter poucas lembranças
E muuita curiosidade.

São sempre mais palavras que respostas
Sempre mais vontades que sorrisos

E você agora é só mais uma parte
Dessa paisagem estranha que eu assisto

Queria que as janelas se mexessem
como mexiam as janelas do seu carro...

Viro de costas todos os porta-retratos,
se me vigiam com seus olhos imóveis.

Depois de tantas conversas sobre nada
Tenho muito assunto quando falo sozinha

A loucura é sempre tão solitária
Queria acreditar em telepatia
E confessar coisas que eu ainda não senti
Contar idéias que ainda não pensei

As vezes a raiva é maior que os motivos

Tem horas que um sorriso resolve
Tem coisas que só seu abraço destranca

Como eu faço pra domar tanta vontade?
Que mesmo tão enorme, é tão discreta...

Já foram tantos absurdos, coincidências, suspresas
Mas nada que durasse mais que algumas horas.

É difícil imaginar tudo o que o medo impede,
os limites que nossas atitudes criam.

Gosto quando encontro alguém que aceite ser provocado,
que se encante com o meu cinismo
que a gente possa rir e se assustar ao mesmo tempo.

(E logo com o tempo se desperta
Uma sensação nova que aquece,
uma loucura calma,
arrepios e choques leves,
até eu não sentir mais nada,
a não ser minha pele tão viva e ...cócegas...)

Quando vai embora eu guardo então outras poucas lembranças
E outras muuuitas curiosidades.

quinta-feira, junho 14, 2007

O que está acontecendo? (O mundo está ao contrário e ninguém reparou...)

Alisa as almas ásperas e lhes dá um novo desejo para experimentar, todo mundo sai mais rico, não por ser anistiado ou surpreendido, não por ser alegrado ou oprimido por uma bondade alheia, mas sim mais rico em si mesmo, mais novo do que antes, talvez mais incerto, mais suave, mais frágil, mais quebrado, mais cheio de esperanças que ainda não têm nome, cheio de novas vontades e energias, cheios de novas má-vontades e contra energias.

Onde vós vedes coisas ideais eu vejo- coisas humanas, ah, coisas demasiado humanas.


Nietzche- Ecce Homo

Escritores Criativos e Devaneios

De que fontes esse estranho ser, o escritor criativo, retira seu matéria, e como consegue impressionar-nos com o mesmo e despertar-nos emoções das quais talvez nem nos julgássemos capazes. Nosso interesse se intensifica ainda mais pelo fato de que, ao ser interrogado, o escritor não apresenta uma explicação, ou pelo menos nenhuma satisfatória.

Ao brincar, toda criança se comporta como um escritor criativo, pois cria um mundo próprio, ou melhor, reajusta os elementos de seu mundo de forma que lhe agrade.

Equiparando as suas ocupações do presente, aparentemente tão sérias, ao seus jogos de criança, o adulto pode conquistar o prazer proporcionado pelo humor.

O adulto acalenta suas fantasias como bem mais íntimo, e em geral preferiria confessar suas faltas do que confiar a outro suas fantasias. Se as pessoas fazem tanto mistério a respeito do fantasiar, como o conhecemos tão bem?

Quando um escritor criativo nos apresenta suas peças, ou nos relata o que julgamos ser de seus próprios devaneios, sentimos prazer, provavelmente originário da confluência de muitas fontes.

Talvez até grande parte desse efeito seja devido à possibilidade que o escritor nos oferece de, dali em diante, nos deleitarmos com nossos próprios devaneios, sem auto-acusação ou vergonha.

Escritores Criativos e Devaneios- Sigmund Freud

quarta-feira, junho 13, 2007

Falando em autonomia...

Quando observamos a quantidade e a variedade dos estabelecimentos de ensino e de aprendizado, assim como o grande número de alunos e professores, é possível acreditar que a espécie humana dá muita importância à instrução e à verdade. Entretanto, nesse caso, as aparências enganam.

A cada trinta anos, desponta do mundo uma nova geração, pessoas que não sabem nada e agora devoram os resultados do saber humano acumulado durante milênios, de modo sumário e apressado, depois querem ser mais espertas do que todo passado.

Sua honra é baseada no fato de terem informações sobre tudo, sobre todas as pedras, ou plantas, ou batalhas, ou experiências, sobre o resumo e o conjunto de todos os livros. Não ocorre a eles que a informação é um mero meio para a instrução, tendo pouco ou nenhum valor por si mesma.

A maior parte de todo o saber humano em cada um dos seus gêneros, existe apenas no papel, nos livros, nessa memória de papel da humanidade. Apenas uma pequena parte está realmente viva, a cada momento dado, nas pessoas.

Schopenhauer- A arte de Escrever.

Psicologia de Grupo

O indivíduo, nas relações que já mencionaei, cai sob a influência de apenas uma só pessoa ou de um número bastante reduzido de pessoas. Ora, quando se fala de psicologia social ou de grupo, costuma-se deixar essas relações de lado e isolar como tema de indagação o influenciamento de um indivíduo por um grande número de pessoas simultaneamente, pessoas com quem se acha ligado por algo, embora, sob outros aspectos e em muitos respeitos, possam ser-lhe estranhas.

O fato de haverem sido transformados num grupo os faz sentir, pensar e agir de maneira muito diferente daquela pela qual cada membro dele, tomado indivualmente, sentiria, pensaria e agiria, caso se encontrasse em estado de isolamento. Há certas idéias e sentimentos que não surgem ou que não se transformam em atos, exceto no caso de indivíduos que se transformam num grupo.

Por traz das causas confessadas dos nossos atos jazem indubitavelmente causas secretas que não confessamos. A maior parte de nossas ações cotidianas são o resultado de motivos ocultos que fogem à nossa observação.

O indivíduo que faz parte de um grupo adquire por considerações numéricas, um sentimento de poder invencível que lhe permite render-se a instintos que, se estivesse ele sozinho, teria mantido sob coerçao.

Quanto ao trabalho intelectual, permanece um fato, na verdade, que as grandes decisões no domínio do pensamento e as momentosas descobertas e soluções de problema só são possíveis ao indivíduo que trabalha em solidão.

Quando um grupo se foema, a totalidade dessa intolerância se desvanece. Enquanto uma formação de grupo persiste ou até onde ela se estende, os indivíduos do grupo comportam-se como se fossem uniformes.

Sigmund Freud- Psicologia de Grupo e Análise do Ego.

terça-feira, junho 12, 2007

Por mais intransmissíveis...

"É realmente terrível", resmungou para si mesma, "como todas as criaturas discutem".

"Então deveria dizer o que quer dizer", continuou a Lebre de Março.
"É o que faço", respondeu Alice apressada, "pelo menos eu quero dizer o que digo... é a mesma coisa."
"Nem um pouco!", disse o chapeleiro. "Ora, você poderia dizer que "'vejo o que como' é a mesma coisa que 'como o que vejo'"
"Você poderia dizer", acrescentou o Arganaz, que parecia estar falando no meio do sono "que 'respiro quando durmo' é a mesma coisa que 'durmo quando respiro'."

"Se você conhecesse o tempo como eu conheço"- disse o chapeleiro, "não falaria em desperdiçá-lo, como se fosse uma coisa. É um senhor."

"Concordo plenamento com você", disse a Duquesa. "E a moral disso é... ' Seja o que parece ser'... ou se você quer que eu fale de forma mais simples... 'Nunca imagine que você é senão o que poderia parecer aos outros que o que você foi ou poderia ter sido não era senão o que você tinha sido que lhes teria parecido diferente'."

"Pois podia acontecer que eu sumisse completamente como uma vela. E o que eu seria então?"- E ela tentou imaginar com o que se parece a chama de uma vela depois de apagada, pois não conseguia se lembrar de jamais ter visto uma coisa dessa.

Alice no País das Maravilhas- Lewis Carrol.

Dia dos Namorados- Passa em casa...

Passe Em Casa
Arnaldo Antunes, Carlinhos Brown, Margareth Menezes e Marisa Monte

Passam pássaros e aviões
E no chão os caminhões
Passa o tempo, as estações
Passam andorinhas e verões
Passa em casa
Tô te esperando, tô te esperando
Passa em casa
Tô te esperando, tô te esperando
Estou esperando visita
Tão impaciente e aflita
Se você não passa no morro
Eu quase morro, eu quase morro
Estou implorando socorro
Ou quase morro, ou quase morro
Vida sem graça se você não passa no morro
Já estou pendido que
Passe um tempo, passe lá
Passo mal com os meus lençóis
Passe agora, passe enfim
Um momento pra ficarmos sós
Passe em casa
Tô te esperando, tô te esperando
Passe em casa
Tô te esperando, tô te esperando
Estou esperando visita
Tão impaciente e aflita...
Passe em casa

...

Ninguém = Ninguém
Humberto Gessinger

há tanta gente pelas ruas
há tantas ruas e nenhuma é igual a outra
me espanta que tanta gente sinta
(se é que sente) a mesma indiferença

há palavras que nunca são ditas
me espanta que tanta gente minta
(descaradamente) a mesma mentira

entre duas pessoas
entre quatro paredes
tudo fica claro
ninguém fica indiferente

me assusta que justamente agora
todo mundo (tanta gente) tenha ido embora

todos iguais, todos iguais
mais uns mais iguais que os outros

...

Incomunicáveis...

Existe um medo, assim como uma imperdoável ilusão- que faz com que você queira que as coisas sejam outras, e não aquilo que são. O prejuízo disso é enorme.

O outro é real. O resto é abstração. Você faz o que quiser com a imaginação. Mas o outro você não pode imaginar. Ele está sempre a mais ou a menos. Atrapalha. Só que o outro não pode deixar de ser verdade. Não há alternativa.

Nós nos acostumamos a atropelar o próximo como se ele nada fosse, em nome desse ou daquele ponto de vista, que na verdade não é outra coisa se não um ponto de vista.

É grave você ser um autodidata. Você não tem a contestação do outro. O outro será sempre uma criação sua, e não uma barreira ao seu ego. O ego precisa ser consquistado e perdido todo santo dia.

Quando educamos alguém, nós simplesmente tratamos de domesticar essa pessoa, e domesticação não é educação.

Bruno Tolentino em entrevista à revista Educação.

sábado, junho 09, 2007

Tempo é tudo o Que Somos

Bem sei que há um desencontro leve entre as coisas, elas quase se chocam, há um desencontro entre os seres que se perdem uns aos outros entre palavras que quase não dizem mais nada.

Clarice Lispector- Água Viva.

Educação a Distância

A ideologia liberal sempre apregoou que o progresso na escala hierárquica dependeria da vontade e do livre-arbítrio de cada indivíduo, pois não haveria mais quaisquer tipos de impedimentos, concernentes às opções políticas ou mesmo religiosas, que pudessem prejudicar de antemão a possibilidade de ascensão social.

(...)Neste contexto, o desenvolvimento das chamadas escolas de massa tornou-se peça-chave não só para a assimilação de conhecimentos que seriam exigidos nos futuros postos de trabalho, tais como o aprendizado de noções de álgebra, geometria e da gramática da língua vernácula, como também dos valores que deveriam ser internalizados para a manutenção do capitalismo, tais como pontualidade, disciplina e subserviência.

A mesma cultura que produz indivíduos solitariamente "conectados", por meio do maquinário tecnológico que realiza a comunicação on line.
A possibilidade da comunicação instantânea e em tempo real incita o aparecimento do seguinte questionamento: Afinal, o que as pessoas têm para comunicar quando se "conectam"?

Assim, a mera utilização dos recursos audiovisuais mais refinados não significa, aprioristicamente, que as pessoas se comunicam.

Quando a discussão envereda para as formas de aplicação dos recursos para a difusão do ensino superior público e de qualidade no nosso país, o programa Universidade Aberta do Brasil surge, de acordo com a Secretaria de Educação a Distância do MEC, como uma alternativa primordial para viabilizar a formação universitária de 30% dos estudantes brasileiros até 2011.

Os pólos de apoio podem ser identificados, portanto, como elementos cruciais para o desenvolvimento do processo educacional/formativo a distância. Nos locais escolhidos como pólos, os estudantes dos cursos superiores a distância terão acesso a bibliotecas, serão atendidos pelos tutores, assistirão às aulas e terão à sua disposição um laboratório de informática com recursos tecnológicos, tal com o uso da Internet, que lhes possibilitarão estudar os módulos dos respectivos cursos na forma de artigos e apostilas on line, por exemplo.

A liquefação da figura do professor, que se torna uma espécie de prestador de serviços ou mesmo um recurso para o aluno, ilustra, despudoradamente, o seu processo de coisificação.
É neste contexto que o data show, ou seja, o show de dados, expressa não só o modo "adequado" de como se deve transmitir os conteúdos pedagógicos, como também a nova função do professor: o animador de espetáculos audiovisuais.

A violência que se dissemina na fragmentação da forma e do conteúdo das imagens televisivas é expressão de uma sociedade cujas relações de produção se "esmeram" pela reprodução de relações humanas fragmentadas.
As imagens de pessoas e objetos, convertidos em ícones fugazes, travam uma luta titânica entre si com a intenção de permanecer alguns momentos a mais na memória antes de serem pulverizadas e substituídas pelas imagens de "novos" ícones.
E se esta lógica parece imperar quando nos deparamos com as imagens midiáticas, não seria muita pretensão acreditar que o professor estivesse isento de se tornar um destes ícones, quando os conteúdos de suas disciplinas são transmitidos tanto pela televisão quanto pela tela do computador?

Longe de ser inocente, o atual linguajar empregado em geral nos textos sobre educação a distancia prima pela associação da imagem do professor como um mensageiro, um recurso ou mesmo um prestador de serviços pedagógicos.

O emprego de tais predicados denota a existência do fetiche tecnológico que se baliza na supremacia da comunicação secundária sobre a primária, de tal modo que há hoje o sério risco de revitalização do conhecido e malfadado tecnicismo pedagógico.

Será que a ciência permanecerá e os homens continuarão a passar?

Trechos do Artigo: Educação a distância ou educação distante? O Programa Universidade Aberta do Brasil, o tutor e o professor virtual- Antonio Zuin

sexta-feira, junho 08, 2007

Sociedade do Conhecimento ou Economia do Conhecimento?

O debate envolvendo a questão do ensino superior como bem público (bem coletivo) ou como bem privado (individual) parece ser bastante recente, embora possa ter raízes econômicas e políticas antigas, difusas ou não, contemporâneas da formação do Estado liberal, e presentes em obras como a Riqueza das nações, de Adam Smith.

Nesse texto, além de enfatizar - como Hobbes já o fazia em O Leviatã - a competitividade entre homens, organizações e instituições de toda a natureza, inclusive as educacionais, como princípio fundamental do progresso, Adam Smith afirma, de modo bastante ambíguo, que, se não houvessem instituições públicas destinadas à educação, só seria ensinado o que fosse imediatamente útil.

Sem pretender maior precisão, pode-se indicar que esse debate, no que concerne especificamente ao ensino superior,tem início mais evidente na década de 1980.

Em documento de 1986, intitulado Financing education in developing countries - An exploration of policy options (WB, 1986), o Banco Mundial defende de forma exaustiva a famosa tese do maior retorno social e individual dos investimentos em educação básica que o dos investimentos em educação superior.

"Evidências demonstram que as pessoas estão dispostas a pagar pela educação. Na África, o retorno privado assegurado pela educação superior tem sido tão alto que, mesmo após a redução do crédito educativo ou a imposição de taxas, a educação superior ainda continuará sendo um atrativo para investimentos pessoais. (WB, 1986, p. 17)"

"O ensino superior responde a muitas das condições identificadas por Barr como características de um bem privado, que se pode subordinar às forças do mercado. Em primeiro lugar, o ensino superior não pode ser tratado como um bem estritamente público. Isso se deve a suas condições de competitividade (oferta limitada), excluibilidade (seguidamente se pode obtê-lo mediante pagamento) e recusa (não é requerido por todos), todas características que não respondem às de um bem estritamente público, mas sim às de um bem privado. Em segundo lugar, os consumidores do ensino superior estão razoavelmente bem informados e os provedores freqüentemente estão mal informados - condições ideais para o funcionamento das forças do mercado. (WB, 1998, p. 5)"

Stiglitz, ex-economista-chefe do Banco Mundial, a respeito do conhecimento como bem público global, escreve em caráter pessoal (como afirma) em 1999:

"Sem dúvida, para adquirir e usar conhecimento, os indivíduos podem ter que efetuar despesas - assim como teriam que gastar para retirar água de um lago público. O fato de que possa haver custos significativos associados à transmissão de conhecimento não afeta em nada a natureza de bem público do conhecimento: provedores privados podem assegurar a "transmissão" por uma taxa que reflita o custo marginal da transmissão, enquanto, ao mesmo tempo, o bem em si pode manter-se gratuito. (1999)"

Evidentemente que por si o mercado não vai criar esse tipo de sistema. Os mercados requerem lucros e isso pode relegar importantes oportunidades e deveres de ensino.
As ciências básicas e as humanidades, por exemplo, são essenciais para o desenvolvimento nacional, mas seguramente recebem recursos insuficientes, a menos que os líderes educacionais, os que contam com recursos para pôr em prática suas visões, promovam-nas ativamente.
É necessário que os governos desempenhem um novo papel como supervisores da educação superior, mais que como gestores.
Deveriam concentrar-se em estabelecer os parâmetros dentro dos quais se possa alcançar o êxito, enquanto permitem que as soluções específicas aflorem das mentes criativas dos profissionais da educação superior.

Jamais como hoje a universidade foi pensada como parte da economia.
Jamais como hoje o conhecimento, a ciência e a tecnologia foram tão valorizados como mercadoria capital a ser apropriada hegemonicamente pelas grandes corporações globalizadas e no interesse dos países centrais.
Se o diagnóstico neoliberal aponta a falta de competitividade como a grande fragilidade da economia, na crise do Estado do Bem-Estar, é essa característica-chave da empresa econômica e do mercado que, aos poucos, vai se implantando na universidade e tornando-se constitutiva de sua identidade.
A idéia de uma universidade organizada e gerida nos moldes empresariais, trabalhando com uma semimercadoria no quase-mercado educacional está cada vez mais presente no discurso e nas práticas oficiais das políticas públicas de educação superior.

Trechos do Artigo- Universidade pública estatal: entre o público e privado/mercantil-Valdemar Sguissardi

Potencialidades x Anestesia... (Quem são eles?)

O sofrimento, a frustração, a impotência do indivíduo, derivam de um sistema funcionando com alta produtividade e eficiência, no qual ele aufere de uma existência em nível melhor do que nunca.
A responsabilidade pela organização de sua vida no todo, no "sistema", a soma total das instituições que determinam, satisfazem e controlam sua necessidades.
O impulso agressivo mergulha no vácuo- melhor, o ódio encontra-se com sorridentes colegas, atarefados concorrentes, funcionários obedientes, prestimosos trabalhadores sociais, que estão todos cumprindo seus deveres e são todos vítimas inocentes.

O ego experimenta o ser como "provocação", como "projeto",
experimenta cada estado existencial como uma restrição que tem de ser superada,
transformada noutra.
O ego torna-se precondicionado para dominar a ação e a produtividade, mesmo antes de qualquer ocasião específica exigir tal atitude.

Na medida em que a Psicologia rasga o véu ideológico e descreve a construção da personalidade, é levada a dissolver o indivíduo:
sua personalidade autônoma surge-nos como a manifestação congelada da repressão geral da humanidade.
A autoconsciência e a razão, que conquistaram e deram forma ao mundo histórico, fizeram-no à imagem e semelhança da repressão, interna e externa.

O controle básico do tempo de ócio é realizado pela própria duração do tempo de trabalho,
pela rotina fatigante e mecânica do trabalho alienado,
o que requer que o lazer seja um relaxamento passivo e uma recuperação de energias para o trabalho.
Só quando se atingiu o mais recente estágio da civilização industrial, quando o crescimento de produtividade ameaça superar os limites fixados pela dominação repressiva,
a técnica de manipulação das massas criou então uma indústria de entretenimentos, a qual controla diretamente o tempo de lazer. Não se pode deixar o indivíduo sozinho, entregue à si próprio.

A mecânica da linha de montagem, a rotina do escritório, o ritual da compra e venda estão livres de qualquer relação com as potencialidades humanas.
As relações de trabalho converteram-se, em grande parte, em relações entre pessoas como objetos permutáveis.
Certo, a concorrência ainda predominante requer um certo grau de espontaneidade e individualidade; mas essas características tornaram-se tão superficiais e ilusõrias quanto a concorrência a que pertencem.

Sob essa ilusória superfície,
todo o mundo de trabalho e seua recreação se tornou um sistema de coisas animadas e inanimadas- todas igualmente sujeitas à administração.
A existência humana nesse mundo é mero recheio, matéria, substância, que não possui em si mesma o princípio de seu movimento.

Com o declínio da consciência, com o controle da informação, com a absorção do indivíduo na comunicação em massa,
o conhecimento é administrado e condicionado.
O indivíduo não sabe realmente o que se passa; a máquina esmagadora de educação e entretenimento une-o a todos os outros indivíduos, num estado de anestesia do qual todas as idéias nocivas tendem a ser excluídas.
E como o conhecimento da verdade completa dificilmente conduz à felicidade, essa anestesia geral torna os indivíduos felizes.

A eliminação das potencialidades humanas do mundo de trabalho cria as precondições para a eliminação do trabalho do mundo das potencialidades humanas.

Marcuse- Eros e Civilização.

Eu vejo tudo enquadrado, remoto controle...

Como pessoas, nós estamos imersos em conjuntos de relações sociais e estamos constantemente envolvidos em comentá-las, em representá-las e em transformá-las através de símbolos, ações e palavras. As formas simbólicas através das quais nós nos expressamos e entendemos os outros não constituem um outro mundo etéreo que se coloca em oposição ao que é real: ao contrário, elas são parcialmente constitutivas do que em nossa sociedade é "real". (...) Estamos estudando um aspecto da vida social que é tão real quanto qualquer outro.

O mundo de hoje, um mundo que é sempre mais atravessado por redes institucionalizadas de comunicação e em que as experiências das pessoas está cada vez mais mediada por sistemas técnicos de produção e transmissão simbólica.

A transmissão de uma forma simbólica implica necessariamente a separação, até certo ponto, dessa forma do contexto original de sua produção: ela se distancia desse contexto, tanto espacialmente quanto temporalmente, e é inserida em novos contextos que estão localizados em tempo e espaços diferentes.

Parte do que constitui as sociedades modernas como "modernas" é o fato de que a troca de formas simbólicas não está mais restrita a contextos de interação face-a-face, mas é mediadam de maneira sempre mais ampla e crescente, pelas instituições e mecanismos da comunicação de massa.

O desenvolvimento dos meios técnicos não deve ser visto como um mero suplemento das relações sociais preexistentes: devemos ver esse desenvolvimento como servindo para criar novas maneiras de agir e interagir, novas maneiras de expressarmo-nos e de respondermos às expressões dos outros.

O aparelho de televisão, muitas vezes, ocupa um lugar central dentro da casa e torna-se o ponto ao redor do qual outros espaços e atividades são organizados. (...) Mas o desenvolvimento dos meios técnicos pode transformar as condições de vida dos receptores de um modo mais complexo e menos evidente. Pois ele possibilita às pessoas experimentar acontecimentos que têm lugar em locais distantes espaciais e temporalmente, e esta experiência pode, por sua vez, criar ou estimular formas de ação ou resposta da parte dos receptores. A recepção de acontecimentos mediada pela comunicação aumenta enormemente o quadro de experiências possíveis a que as pessoas estão, em princípio, expostas. Possibilita às pessoas de yna oarte do mundo testemunhar acontecimentos que têm lugar em outras partes e responder, individual ou coletivamente, a esses acontecimentos.

O mito do receptor passivo: A idéia de que os receptores das mensagens da mídia são espectadores passivos, que simplesmente absorvem o que se passa diante deles na tela ou o que está presente no papel, é um mito que não se coaduna com o caráter atual de apropriação como um processo contínuo de interpretação, de discussão, apreciação e incorporação.

Ideologia e Cultura Moderna- Jonh B. Thompson

quarta-feira, junho 06, 2007

Comunicação: Livres de Limitações...

Douglas, em "O destino social do rádio" escreveu: "Como é fina a textura da teia que o rádio está agora entrelaçando! Está conseguindo atingir a tarefa de fazer com que sentimos juntos, pensamos juntos, vivemos juntos" (Douglas, 1987: 306)

Um destes guias considerava que os internautas "livres de limitações físicas... estão desenvolvendo novos tipos de comunidades coesivas e eficazes - as quais são definidas mais pelo interesse comum e pela finalidade do que por um acidente da geografia, nas quais o que conta realmente é o que você diz, pensa e sente, e não como você olha" (Gaffin e Kapor, 1991: 8-9)

Rheingold considera que as comunidades virtuais unem indivíduos de todos os cantos do mundo, que trocam a informação ou experiências. Mais amplamente, constroem laços de cooperação e desenvolvem conversas que são tão intelectual e emocionalmente ricas quanto aquelas da vida real. É um mundo de interação equilibrada entre iguais. E também, a rede pode tornar possível não somente o trabalho de forma coletiva mas também para restabelecer um debate público e uma vida democrática.

Mais tarde a imprensa começou a escrever extensivamente sobre a Internet. Em 1995 um editorial do Times escreveu que:

"A maioria de sistemas convencionais do computador são hierárquicos e privados; funcionam a partir da cópia de programas em uma estrutura da pirâmide que da poderes ditatoriais aos operadores de sistema que estão sentados no topo. A Internet, pelo contrário, é aberta (sem proprietário) e apaixonadamente democrática. Ninguém a possui. Nenhuma organização a controla. Ela cruza limites nacionais e não responde a nenhum soberano. É literalmente independente... Soltadas as armadilhas externa da riqueza, do poder, da beleza e do status social, os povos tendem a ser julgados no ciberespaço da Internet somente por suas idéias." (Times, edição especial, março 1995: 9)

A história da tecnologia de informação na esfera privada, como no mundo do negócio, origina-se no século dezenove. A vida pública mudou profundamente durante esse período. Richard Sennett (1977) considera que ela perdeu seu caráter de convivência e de interação, para transformar-se em um espaço em que as pessoas misturam-se em silêncio.

Nós testemunhamos assim uma privatização da esfera pública do entretenimento. Tantos quantos os registros da hora do show, a recepção tornou-se uma atividade da família, um pequeno ritual. Era freqüentemente o pai que ajustava o rádio e o silêncio era exigido para lhe escutar.

Com a família reunindo-se em torno da televisão para assistir coletivamente, isto abandonou o rádio que se transformou em um meio individual.
Devido à portabilidade e o baixo custo dos transistores de rádios, todos poderiam escutá-lo sozinho em seu quarto ao fazer outra coisa. Esta nova família poderia "viver junto separadamente".
Foi provavelmente com o rock que o uso do transistor e o meio relacional, o gravador, apareceram com toda a força. Visto que nos anos 1950 unir-se para escutar o rádio era decisivo, escutar foi subseqüentemente feito em casa, especial por meninas adolescentes cuja cultura se transformou em uma "cultura de quartos, o lugar onde as meninas se encontram, escutam a música e ensinam habilidades de composição e praticam seu dançar".
A música rock escutada em um transistor de rádio ou um gravador deu aos adolescentes a oportunidade de controlar seu próprio espaço.

Apesar do discurso sobre a revolução da sociedade de informação, temos que concordar que o microcomputador seguido por sua conexão à Internet não se espalhou tão rapidamente nas casas quanto o rádio e a televisão.

A sociabilidade entre internautas tem também um outro grau de complexidade: o fato que o indivíduo pode se comunicar anonimamente através de um pseudônimo, possuir diversos pseudônimos e conseqüentemente diversas personalidades.

Sherryu Turkle estudou a questão das múltiplas identidades na Internet e especialmente nos MUDs. Estas diferentes vidas podem ser vividas simultaneamente em diferentes janelas na mesma tela de computador. "Eu racho minha mente, falo com uma outra pessoa, posso me ver como sendo dois ou três ou mais. E eu volto apenas sobre uma porção de minha mente ou então outra quando eu vou de janela à janela"

Em casa, a Internet combina características de diversos meios da comunicação e da informação. Mas esta ferramenta da comunicação e da informação multiforme tende também a indeterminar a separação entre o profissional e as esferas privadas. Facilitou o trabalhar em casa e, às vezes, atendeu às coisas pessoais no trabalho.

A História dos Novos Meios de Comunicação- Patrice Flichy

terça-feira, junho 05, 2007

Neoliberalismo na Educação

Atrela a educação escolar à preparação para o trabalho e a pesquisa acadêmica ao imperativo do mercado ou às necessidades da livre iniciativa.
Assegura que o mundo empresarial tem interesse na educação porque deseja uma força de trabalho qualificada, apta para a competição no mercado nacional e internacional.
Valoriza as técnicas de organização, o raciocínio de dimensão estratégica e a capacidade de trabalho cooperativo.

Como observamos, a novidade, se é que assim se pode chamar, do projeto neoliberal para a educação não é só a privatização.
O aspecto central é a adequação da escola e da universidade pública e privada aos mecanismos de mercado, de modo que a escola funcione à semelhança do mercado.

O discurso neoliberal condena o populismo, o corporativismo, o ensino ineficaz e a falta de produtividade.
(...)
A expressão "falta de produtividade" tem em contrapartida a produtividade da pesquisa relevante, isto é, utilitária, bem financiada, altamente rendosa, segundo critérios mercantis.
No fundo dessas três críticas, percebe-se que o que incomoda os neoliberais é a liberdade acadêmica, o distanciamento da universidade pública em relação aos mecanismos de mercado, a ausência de submissão aos critérios da produção industrial da cultura.

Em outras palavras, trata-se de rimar a escola com negócio.
Mas não qualquer negócio. Tem de ser um bem-administrado.
O raciocínio neoliberal é tecnicista.

Resta ainda uma questão.
O discurso neoliberal insiste no papel estratégico da educação para a preparação da mão-de-obra para o mercado.
Mas não se pode esquecer que o neoliberalismo torna-se hegemônico num momento em que a revolução tecnológica impõe o desemprego estrutural.
Lembrando Braverman, uma das tendências da educação na sociedade contemporânea é o prolongamento do período escolar e, com isso, a escola evita que um contingente razoável de jovens dispute vagas no mercado darwinista de trabalho.

Em que pese o fato de a escola ser cada vez mais necessária para preparar profissionais para o mercado de trabalho, é preciso perguntar: e quanto aos excluídos do mundo do trabalho, que papel caberá à escola senão o de tornar-se uma espécie de babá de futuros desempregados?

Perry Anderson- Balanço do neoliberalismo.

A Universidade Em Questão

Os princípios mercadológicos vem contaminando as teorias, formalizando basicamente o conhecimento como meio de atingimento de fins econômicos.

Considerar o conhecimento como mediação de cidadania, em seu sentido mais abstrato, significa compreender que uma das condições do exercício da liberdade é o acesso à informação qualitativamente relevante e quantitativamente suficiente, bem como, à educação que permita interpretar adequadamente tais informações.

Por sua vez o ensino universitário deve educar o aluno para a atividade da pesquisa, recuperar os conteúdos historicamente elaborados e realizar os treinamentos requeridos que permitam a cada educando não apenas exercer uma atividade profissional ou científica competente na área de sua formação, mas também um exercício crítico sobre as dimensões estéticas, éticas, políticas, econômicas e culturais que condicionam seus exercícios de liberdade, gerando interpretantes semióticos intelectuais, energéticos e afetivos adequados à construção de uma sociedade democrática e solidária.

Neste debate é perceptível que, sob os auspícios das reformas neoliberais, a autonomia da universidade pública vem sendo perdida, uma vez que em razão da falta de recursos que garantam a sua independência, ela vem assumindo tais parcerias com empresas privadas, colocando-se na função pragmática de formar capital humano ou de desenvolver conhecimentos que se configurarão em propriedade privada das empresas capitalistas que financiam as pesquisas.

De fato, a digitalização do conhecimento não apenas tem permitido a redução do emprego de trabalhadores na produção de um mesmo volume de mercadorias, como também possibilitou a organização de poderosos bancos de dados facilmente pesquisáveis, liberando a atividade teórica para o exercício criativo sobre dados facilmente recuperáveis e comunicáveis. Os novos meios de comunicação, como a Internet, não somente ampliaram o acesso à informação como aumentaram a velocidade de sua circulação, permitindo a constituição de comunidades de pesquisadores sobre os temas mais diversos. Listas de discussão, conferências virtuais e outros expedientes permitem um intercâmbio cotidiano e instantâneo de informações entre pessoas que estejam em qualquer parte do planeta. Freqüentemente, muitos pesquisadores mantém um contato muito mais intenso com parceiros de outros países do que com colegas do mesmo setor na universidade. Por outra parte o aprimoramento de programas de tradução e a proliferação de sites educativos permite que estudantes tenham acesso a textos elaborados sobre os diversos conteúdos de sua formação acadêmica e que muitos blocos de textos sejam diretamente transportados de sites e enciclopédias eletrônicas a trabalhos escolares sem a adequada investigação, análise e síntese.

Assim, um dos grandes desafios da educação e da universidade está em ensinar o educando a localizar, interpretar e reagir às informações disponibilizadas em inúmeros bancos de dados através de múltiplos canais de acesso, desenvolvendo o aprendizado da pesquisa, da capacidade analítica, interpretativa e criativa, da habilidade em problematizar os objetos de investigação, construir sínteses de elementos relevantes aos propósitos almejados, posicionar-se eticamente frente aos conflitos humanos, comunicar o conhecimento elaborado e transformar suas próprias ações com base nos graus de criticidade e sensibilidade alcançados.

A universidade pública, gratuita e autônoma é um patrimônio imprescindível para a promoção da liberdade e como tal deve ser preservada. Diferentemente de se tornar um mero instrumento de lucro para iniciativa privada, as universidades precisam manter-se como espaço de produção, reprodução e socialização do conhecimento que, interferindo nos processos econômicos, políticos e culturais em curso em nossa sociedade, colaborem com a ampliação do exercício da cidadania e com a construção e avanço de um projeto de desenvolvimento nacional voltado à promoção das liberdades públicas e privadas, enfrentando, desse modo, as diversas formas de exclusão que se aprofundam em nosso país.

A Universidade em Questão -o conhecimento como mediação da cidadania e como instrumento do capital.

Euclides André Mance

segunda-feira, junho 04, 2007

Grupo de Discussão- O Papel da Universidade

A diferença entre Pensar- Operar e Agir.

A universidade tinha que ser um lugar, o lugar do trabalho intelectual.
O que é o trabalho intelectual?
A tradição filosófica da qual ela é herdeira distingue pensar de agir.
Essa operacionalidade da universidade atual,

ela justamente suprime da universidade, do trabalho intelectual, a dimensão ético-política.
No campo político, você pode distinguir meios de fins?
Você aprende e apreende os meios políticos com a indissociabilidade dos meios e fins.

A ação como se faz e para que se faz, no campo da vida política.
O que parece é que o papel da universidade é ser um lugar onde a discussão,

a formação do conhecimento é feita...
Demanda tempo, aprofundamento, permanência na relação com certo conhecimento...

- o que nós vemos aqui é mais uma reprodução de conhecimento...

a gente só aprende o que já existe..
ao mesmo tempo que os professores falam que a gente tem que mudar, eles não falam como...
Tem que ser diferente, mas ser diferente como eu...
Tem que refletir, mas refletir como eu...
No fim, o certo é ler o manual da Folha, ter o padrão Globo de qualidade.
Você só está operando, não está agindo.

Vêem a faculdade como um mero instrumento pra você conseguir um emprego e ganhar um salário bom no fim do mês.

A direção que se dá à produção de conhecimento na faculdade.
A medida que você ou produz dois artigos por ano ou você não pode dar aula na pós-graduação,

essa orientação pragmática da universidade é uma orientação ditada pela organização do mercado.
A universidade não se orienta para aquilo que seriam as melhores,

as finalidades melhores,
mas por essa orientação de mercado,
então isso é uma autonomia heterônoma.

A questão é, não podemos condenar ninguém por querer sobreviver,

pra sobreviver a gente precisa ganhar o salário tudo,
não sei se é esse exatamente o ponto...

- A gente vive numa sinuca entre a produção e a reflexão.
Ao mesmo tempo que a gente precisa ter o conhecimento para passar esse conhecimento, precisa saber passar aquela coisa, ter a técnica.
Cada vez mais trabalham só a parte técnica,
mas se é sobre tudo o que a gente vai falar, a gente tem que conhecer sobre tudo.

É preciso ter abertura para pensar, para experienciar as coisas.

Óbvio que a gente não pensa por natureza também.
E quanto mais você lê, mais você aprende, mais você tem ferramentas para pensar.

Momento de Greve: A Ordem x A Desordem.

O sentido de ordem tem um aspecto mítico.
É uma ordem que existe porque ela existe.
Ela funciona muito bem para produzir o medo,

que é esse medo da experiência, que é uma idéia de proibido que não se sabe da onde veio.
O que eu estou criticando é uma ideologia da ordem no mundo em desordem.
O capitalismo é a mais absoluta desordem.

Na verdade há uma dialética entre ordem e desordem.
Acho que falar em liberdade é muito difícil.
O professor te dar a liberdade não necessariamente desenvolve sua autonomia.

Estamos em greve, um momento de questionamento à uma ordem,

até num duplo sentido: uma certa ordem que a universidade está tomando e uma ordem que vem de cima, uma lei.
O que nós queremos produzir é uma desordem?
Olha, em relação àquela ordem, sim. Você não tem “a” ordem.

Se você quer pensar o mundo, você tem que pensar contradições,
o mundo não é todo certinho, onde tudo encaixa.
Esse pensar por contradições tira a gente do mundo das certezas, e isso é bom.

- O que a gente está fazendo é uma desordem que a gente está ordenando para virar uma outra ordem que desordenou a ordem que era antes...
A universidade no fim envolve a capacidade de construção, e desconstrução...
Não se desordena de qualquer jeito...Podemos desordenar ordenadamente

Conclusão do GD

Não é racionalmente defensável considerando o que seria ideal para a universidade você submeter a universidade à tutela de governador A, B, C.
Observemos o que aconteceu na gestão do Alckmin.
A Universidade já está sob tutela, já estava sob tutela sem as leis.
As leis pioram a situação.
Na verdade a gente quer resistir.
A desordem não é para construir a universidade que a gente sonha, mas para resistir à uma destruição.

Um debate como esse, que é menos emocional, menos voluntarioso, para conversar, compreender é tão importante quanto estar na passeata.

- E essa passeata é o resultado da falta de diálogo, se a gente tem que estar lá gritando é porque não teve espaço para conversar como estamos conversando agora.


Convidado: Professor Ari Maia.

Vigiar e Punir

A disciplina “fabrica” indivíduos; ela é a técnica específica de um poder que toma os indivíduos ao mesmo tempo como objetos e como instrumentos de seu exercício.
Não é um poder triunfante que, a partir de seu próprio excesso, pode-se fiar em seu superpoderio;
é um poder modesto, desconfiado, que funciona a partir de uma economia calculada, mas permanente.

O momento em que passamos de mecanismos histórico-rituais de formação da individualidade

à mecanismos científico-disciplinares,
em que o normal tomou o lugar do ancestral, e a medida o lugar do status,
substituindo assim a individualidade do homem memorável pela do homem calculável,
esse momento em que as ciências do homem se tornaram possíveis,
é aquele em que foram postas em funcionamento uma nova tecnologia do poder e uma outra anatomia política do corpo.

O indivíduo é, sem dúvida,

o átomo fictício de uma representação “ideológica” da sociedade;
mas é também uma realidade fabricada por essa tecnologia específica de poder
que se chama “disciplina”.
Temos que deixar de descrever sempre os efeitos de poder em termos negativos:
ele “exclui”, “reprime”, “mascara”, “recalca”, “censura”, “abstrai”, “esconde”.
Na verdade, o poder produz, ele produz a realidade;
produz campos de objetos e rituais da verdade.
O indivíduo e o conhecimento que dele se pode ter se originam nessa produção.

Vigiar e Punir- Michel Foucault.

domingo, junho 03, 2007

Aprender o que ainda Não se Sabe

- Waters (2004) constata que "a idéia dominante da universidade de hoje em dia é evitar as idéias", levando então a meditar sobre as relações entre, por um lado, computar, medir, avaliar, quantificar e, por outro, ler, pensar, refletir.

- O indivíduo contemporâneo quer ser informado, especializado e experiente para um mercado que o amedronta, e não educado, instruído; já não busca um conhecimento desinteressado a longo prazo, um conhecimento que não esteja imediatamente ligado ao imediatismo do mercado, mas que vise a valores universais e compartilhados.

- A educação seria impotente e ideológica se ignorasse o objetivo de adaptação e não preparasse os homens para se orientarem no mundo. Porém ela seria igualmente questionável se ficasse nisto, produzindo nada além de well adjusted people, pessoas bem ajustadas, em conseqüência do que a situação existente se impõe precisamente no que tem de pior. (Adorno)

- Quase completamente racionalizada, compreendendo o 'educar' como uma ação planejada em direção a um sujeito — plena de objetivos pedagógicos a atingir -, a escola reduziu a grande maioria das relações que ali se estabelecem a relações coisificadas.

- O espírito de empresa, impulsionado atualmente por um movimento incessante, uma atividade desenfreada submetida à urgência, desprovida de reflexão, uma produtividade cega e descomprometida, tenderia a partir de então a ser extirpada das idéias, das mediações, da imaginação.

- A obsessão pela produtividade sempre foi, com raríssimas exceções, na escola (como na fábrica), uma forte característica: o tempo cuidadosamente dividido, marcado pelo sinal que, implacável, dá fim às atividades minuciosamente planejadas e distribuídas por séries, tudo concebido, inclusive o curto — e tão desejado pelas crianças — recreio, para que o tempo na escola seja absolutamente “produtivo”.


- Os saberes constantemente mutáveis implicam e induzem ao transitório, ao efêmero, ao descontínuo, em suma, à instabilidade, um conhecimento que tende por razões intrínsecas à superficialidade, à pressa, um conhecimento difícil talvez mesmo impossível de aprofundar por falta de tempo.

- As condições de apropriação e de transmissão dos saberes nas sociedades contemporâneas estão profundamente transtornadas: a crescente massa de informações contínuas nas sociedades contemporâneas, concomitante a uma reflexividade e a uma fluidez permanente, contribui para formas inéditas de individualismo, acarreta uma fragmentação, uma dispersão, um descomprometimento que obstrui de certo modo a continuidade, o sentimento de si mesmo.

- Será necessário recordar aqui que aprender é ser capaz de aprender o que ainda não se sabe, o que talvez saberemos depois de tê-lo aprendido, o que também talvez jamais conseguiremos aprender, conhecer e também compreender?

Revista Educação & Pesquisa-