sexta-feira, agosto 17, 2007

Instáveis...

Já se foi o tempo em que se criticavam os meios de comunicação produtores da cultura massificada, por “imporem” novas necessidades. A comunicação, para as massas, impõe-se, mas só o faz de forma sutil, sedutora, provocante. Ela incide sobre as necessidades reais não satisfeitas plenamente, e oferecem um contrapeso ao monótono, ao insuportável do cotidiano.

O importante nesses contextos é a consideração de que não há necessidades criadas artificialmente. As saídas podem sê-lo, mas as necessidades têm uma vinculação direta om a experiência de vida e com a relação com a sociedade e os mecanismos que bloqueiam as aspirações e desejos.

Acordar cedo, ônibus cheio, trabalho maçante, relações superficiais, chegar em casa, assistir TV, dormir, acordar cedo... A potencialidade emotiva e ativa de relacionamento dilui-se nesse cotidiano. Através de formas como a novela e o esporte, a televisão possibilita uma vida real, uma prática de emoções, de sentimentos, de alegria e de tristezas, de sensações sexuais que a vida real não mostra.

Mesmo no seu espaço de “repouso”, a pessoa mantêm-se agitada, o relógio permanece marcando seus passos e cronometrando a sua vida. Qualquer coisa que rompa com essa lógica e organização parece inútil, “perda de tempo”. A ansiedade a sensação de estar sempre “funcionando” é o que dá a a impressão de “estar vivo”.

O consumo não se dá em forma real, não são consumidos bens mas “puras aparências”. A “tecnocracia dos sentidos” impera na produção do ilusório, do imaginário, como fator de consumo. Assim, pela sua capacidade de provocar efeitos no comprador e nas pessoas a quem o comprador deseja impressionar, as mercadorias assumem, como fetiches plenos, a situação de agentes reais.

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Dominação Sexual, Mercadoria e Castração

O erotismo mostra quase tudo. É nesse “quase” que está o seu maior perigo. No passado, as mulheres mostravam apenas o calcanhar e no trabalho de “descoberta” encerrava-se a relação dual. Hoje, a mulher esconde apenas a vagina.

A mulher nua é menos erótica que a mulher com um minibiquini, já que o erótico não está na roupa, mas no encobrimento, no escondido, no segredo.

O fato de a mulher no modelo industrial e mercadológico de estética sexual deixar encoberto apenas o seu sexo tem, além disso, um segundo significado: ela, de fato, se reduz à vagina. Além desta, já não há mais o que se descobrir.

Não há aí erotismo mas somente prática da sexualidade. O problema desse tipo de proposta, contudo, é de outra natureza: separação entre sexualidade e vida afetiva. Essa dissolução está na base da consciência-mercadoria: sentimentos, emoções e prazeres devem ser autonomizados, virando fatos sem criadores e sem história: fetiches. O imediatismo, a não reflexão sobre a natureza do desfrute, a oralidade, o prazer do aqui e agora.

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Telenovela e a Lógica do Capital

Na telenovela as cenas são curtas (...) e construídas artificialmente para a produção forçada de emoções: há um ritmo de emoções crescentes que tem que ser interrompido no intervalo para anunciantes.

O modelo prescreve o seguinte: as cenas devem ser em geral curtas para não dispersar a atenção do telespectador, que é “muito inconstante”. Cenas longas, de mais de 1 minuto e 30 segundos devem ser fragmentadas e passadas em partes diferentes, intercaladas por outras cenas para garantir a alternância.

Há uma rejeição do prolongamento dialogal. Não se deve provocar auto-reflexão. A dramatização da telenovela não comporta o choque do telespectador. Há uma construção polarizada dos personagens. A dor está lá, mas ao mesmo tempo não está. A ambientação impede a transmissão de efeitos de solidão muito transparentes, não se opera a iluminação claro-escuro, com sombras.

Cada sequência é formada por diversos miniquadros, que se intervalam sem um pathos próprio ou expressivo, mas confluem para o quadro “emocionante” final, geralmente fechado com o som da canção de fundo.

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Ciro Marcondes Filho- A Linguagem da Sedução