terça-feira, agosto 28, 2007

Naufrágios do nosso entender...

Vemo-nos e não nos vemos. Ouvimo-nos e cada um escuta apenas uma voz que está dentro de si.
As palavras dos outros são erros do nosso ouvir, naufrágios do nosso entender.
Com que confiança cremos no nosso sentido das palavras dos outros?

A imensa série de pessoas e de coisas que forma o mundo é para mim uma galeria intérmina de quadros, cujo interior não me interessa.
Não me interessa, porque a alma é monótona é sempre a mesma em toda a gente;
diferentes apenas as suas manifestações pessoais,
e o melhor dela é o que transborda para o sonho, para os modos, para os gestos,
e assim entra para o quadro que me prende.

Reconstruo, completando...
E isso me servirá de desculpa junto deles,
de ter escutado tão fixamente a escutar-lhes o que não diziam e não quereriam dizer.

Toda a boa conversa deve ser um monólogo de dois...
Devemos, no fim, não poder ter a certeza se conversamos realmente com alguém ou se imaginamos totalmente a conversa.

Fernando Pessoa