quinta-feira, julho 12, 2007

Por que medo?

Exatamente porque é tão forte em mim a fome de me dar a algo ou a alguém, é que me tornei bastante arisca: tenho medo de revelar de quanto preciso e de como sou pobre.

A essa altura, afundados demais, o fato deixou de ser um fato para se tornar apenas sua difusa repercussão.

Recuso-me.
Eu me aprofundei mas não acredito em mim porque meu pensamento é inventado.

Era uma mulher fraca em relação às coisas. Tudo lhe parcia as vezes preciso demais, impossível de ser tocado.
Ela é vaga e audaciosa. Ela não ama, ela não é amada.

Vivia-o tanto que nunca sentira os outros senão como mundos fechados, estranhos, superficiais.

Quem sabe eu tive de algum modo pressa de viver logo tudo o que eu tivesse a viver para que me sobrasse tempo de... de viver sem fatos? de viver.

E que, quando andávamos, eu não sabia que o amor estava acontecendo muito mais exatamente quando não havia o que chamávamos de amor. O neutro do amor, era isso o que nós vivíamos e desprezávamos.

Ah meu amor, não tenha medo da carência: ela é o nosso destino maior. O amor é tão mais fatal do que eu havia pensado, o amor é tão inerente quanto a própria carência, e nós somos garantidos por uma necessidade que se renovará continuamente.

Nesses intervalos nós pensávamos que estávamos descansando de um ser o outro. Na verdade, era o grande prazer de um não ser o outro: pois assim cada um de nós tinha dois.

Clarice Lispector