segunda-feira, maio 07, 2007

O Amor é sempre um Ainda Não...

A pornografia é um suceder contínuo de atos sexuais, sem que necessariamente haja uma história. Os protagonistas masculinos não precisam fazer nada, caminham por uma rua e uma mulher gostosa os leva para a cama. No escritório, uma secretária despe-se e, sem uma única palavra, inicia uma felação. Basta um olhar e as mulheres ficam nuas e disponíveis, são imaginadas como seres fabulosamente sensuais, arrastadas por um impulso irresistível de atirar-se sobre o pênis.

Já os romances femininos podem ser assim esquematizados: há uma heroína que se parece com uma mulher comum. Nunca é belíssima. (...) Num certo ponto da história, encontra um homem extraordinário. É alto, forte, seguro de si. Na maior parte do tempo possuí olhos de aço, cinzentos, frios, distantes. A mulher sente-se perturbada porque ele lhe parece, a um só tempo, fascinante e inatingível. (...) Não sabe, porém, se ele a ama de verdade. Muito pelo contrário, está convencida de que não ama, que se trata apenas de simpatia, amizade, ou então uma aventura. (...) Há, portanto, um duplo mal-entendido. Ambos estão apaixonados, mas ambos pensam não ter o amor retribuído. (...)

A pornografia e os romances cor-de-rosa têm algo em comum. São situações inacreditáveis e impossíveis, mas, para os dois sexos, igualmente excitantes e igualmente incompreensíveis ao outro.
Ambos os gêneros representam a satisfação imediata de um desejo, eliminando a realidade embaraçosa.

A mulher quer deixar uma marca permanente. Quer suscitar um desejo, um amor. Saber que esse amor dura, não se acaba, que o homem pensa nela e continuará a pensar por muito anos. Faz então tudo para seduzi-lo e, mal percebendo ter conseguido, dá meia volta, chegando muitas vezes a fugir definitivamente. “Se quer ser amada para sempre, deve se afastar definitivamente, para que ele jamais possa te-la”.

A fase negativa da sedução feminina é o temor de não possuir fascínio suficiente, de não poder causar a emoção profunda, indelével, de que já falamos.

A mulher das fantasias masculinas diz assim: “Se lhe agrado, aqui estou, tome-me. Se quiser ir embora, de mim não terá nem aborrecimentos, nem rancores, nem queixas, nem chantagens, nem lamentações. Não preciso do seu dinheiro, não sou ciumenta. E, também, se quiser voltar, aqui estou eu, às suas ordens.”

O grande sedutor faz com que a mulher se sinta como quando está diante do espelho, admirando-se, descobrindo-se, fantasiando. Faz com que ela caia de joelhos diante da própria beleza e do próprio fascínio.

O fim de uma paixão é expresso pelo homem como puro desinteresse. Na mulher expressa-se como rejeição.

Deve haver bares onde procurar companhia por uma noite, outros onde encontrar a alma gêmea. Como num grande, imenso supermercado. Basta saber o que se quer, vai-se à seção adequada e procura a melhor marca ao preço mais conveniente. Isso é voluntarismo. Determinar, desde o início o que se quer.

Quer ser gay, quer ser casado, quer ser solteiro, quer ter um romance ou uma experiência orgástica, quer ser monógamo ou polígamo? O voluntarismo parte do pressuposto de que as pessoas podem sempre definir claramente o que desejam. Uma vez determinado, é só procurar seu grupo, ler alguns livros apropriados com as técnicas de conquista e esperar pelo resultado.

Mas não podemos conhecer os nossos fins últimos, os objetos finais dos nossos desejos e do nosso amor, fazendo uma soma aritmética do prazer e do desprazer que nos causaram. Fazemos esse balanço para justificar a nós mesmos o nosso apego a uma pessoa, ou para justificar a nossa decisão em deixá-la.

A religião da intimidade e da verdade total é inconcebível sem uma concepção voluntarista da vida. Se todos revelam tudo, até mesmo os pensamentos mais fugazes, devem comunicar também as coisas mais desagradáveis, como o ódio, o desprezo. Isso é possível porque na cultura voluntarista, a irritação, a agressividade, o mau-humor, são considerados distúrbios passíveis de ser eliminados, sintomas perfeitamente corrigíveis. Existe sempre uma técnica capaz de transformar o desprazer em prazer, o ódio em amor, a aversão em atração.

Resta então o outro caminho: aprender a estar continuamente enamorado, obrigar-se a isso, fingir que está. Percebendo que não se amam ou que não se amam o suficiente, os casais aplicarão as técnicas adequadas. Existem milhares de manuais terapêuticos que ensinam a amar de forma madura, profunda ou romântica.

O Erotismo- Francesco Alberoni