Hoje a mulher não pode esconder uma brotoeja, nada.
Hoje, o beijo quase não existe.
Sábado começará um novo carnaval.
Mas sabemos que, nos bailes e nas ruas, a mulher será sempre uma figura secundária para o homem.
Do mesmo modo que o homem será secundário para a mulher.
Eis o que eu queria dizer: as duas coisas seriam impossíveis no velho carnaval.
Nem a nudez da menina, nem o tédio do homem.
Antes dos nus, a mulher em chagas punha fantasia e máscara nas feridas e era amada por toda uma cidade.
Por onde quer que passasse sentia o desejo anônimo e geral.
Ontem, um médico me confessava o seu espanto.
Os nossos jovens, de ambos os sexos, esquecem antes de amar e sentem o tédio antes do desejo.
Os que esquecem antes de amar.
Nelson Rodrigues, 21/02/68.