terça-feira, dezembro 04, 2007

Além do Princípio do Prazer

Prontamente expressaríamos nossa gratidão a qualquer teoria filosófica ou psicológica que pudesse informar-nos sobre o significado dos sentimentos de prazer e desprazer que atuam tão imperativamente sobre nós.

A maior parte do desprazer que experimentamos é um desprazer perceptivo.
Esse desprazer pode ser a percepção de uma pressão por parte de pulsões insatisfeitas ou da percepção exterma do que é aflitivo em si mesmo, ou excita espectativas desprazerosas, isto é, que é reconhecido como 'perigo'.

A 'ansiedade' descreve um estado particular de esperar o perigo ou preparar-se para ele, ainda que possa ser desconhecido.
O 'medo' exige um objeto definido de que se tenha temos.
'Susto', contudo, é o nome que damos ao estado em que alguém fica, quando entrou em perigo sem estar preparado para ele, dando-se ênfase ao fator da surpresa.

---

Encontramos pessoas em que todas as relações humanas têm o mesmo resultado; tal como o benfeitor que é abandonado por seus protegidos, o homem cujas amizades findam por uma traição por parte do amigo, (...) o amante cujos casos amorosos atravessam as mesmas fases e chegam à mesma conclusão.
Essa 'perpétua recorrência da mesma coisa' não nos causa espanto quando se refere a um comportamento ativo por parte da pessoa interessada, e podemos discenir nela um traço de caráter essencial que permanece sempre o mesmo, sendo compelido a expressar-se por uma repetição das mesmas experiências.
Ficamos muito mais impressionados nos casos em que o sujeito parece ter uma experiência passiva, sobre a qual não possuí influência, mas nos quais se defronta com uma repetição da mesma fatalidade.

Como a repetição de uma experiência aflitiva harmoniza-se com o princípio de prazer?

Nas brincadeiras das crianças, em que repetem experiências desagradáveis pela razão adicional de poderem dominar uma impressão poderosa muito mais completamente de modo ativo do que poderiam fazê-lo simplesmente experimentando-a de modo passivo.

As crianças também nunca se cansam de pedir a um adulto que repita um jogo que com elas jogou, até ele ficar exausto demais para prosseguir. E, se contarmos a uma criança uma linda história, ela insistirá em ouví-la repetidas vezes, de preferência a escutar uma nova, e sem remorsos estipulará que a repetição seja idêntica, corrigindo quaisquer alterações de que o narrador tenha a culpa (...).

É claro que em suas brincadeiras as crianças repetem tudo o que lhes causou uma grande impressão na vida real, e assim procedendo, ab-reagem a intensidade da impressão, tornando-se, por assim dizer, senhoras da situação.

A representação e a imitação artísticas efetuadas por adultos, as quais, diferentemente daquelas das crianças, se dirigem a uma audiência, não poupam os espectadores (como na tragédia, por exemplo) as mais penosas experiências, e, no entanto, podem ser por eles sentidas como altamente prazerosas.

Isso constitui prova convincente de que, mesmo sob a dominância do princípio do prazer, há maneiras e meios suficientes para tornar o que em si mesmo é desagradável um tema a ser rememorado e elaborado.

Além do Princípio do Prazer- Freud.