sexta-feira, dezembro 28, 2007

História da Vida Privada- Relacionamentos

O Prazer

Os sexólogos se encarregam de tranqüilizar os homens e desculpabilizar as mulheres: eles acham que o comportamento mais capaz de conciliar as exgências da ordem social e os imperativos do sexo seria uma "monogamia flexível" (uma ou mais relaçõe estáveis durante a vida, além de relações passageiras e "aventuras").

Pois o controle sexual se reintroduz, substituindo o "dever conjugal" pelo "direito ao orgasmo", que por sua vez se converte em "dever do orgasmo".

O homem passa a procurar ler no olhar de sua parceira a feliz consumação do ato, expressa em gírias como "virar os olhos", "mostrar o branco dos olhos", "ficar com os olhos de pescada frita".

O que contraria a visão anterior da volúpia feminina.
Brantôme aconselhava ao marido que não dê à mulher o gosto dos jogos amorosos, pois "para cada tição em brasa que elas têm no corpo, elas geram outros cem".

Depois de anos de condenação, a masturbação sai do campo do secreto para se tornar- dizem-nos os sexólogos- a melhor preparação para a união satisfatória com o outro.

Por que ficamos sexualmente excitados?
Um espírito singelo daria respostas simples: falta de relações sexuais durante certo tempo, contemplação de um ser desejável, estimulação direta das partes erógenas, etc.

O mecanismo é mais complexo, diz-nos o psicanalista.
R. Stoller afirma que a excitação sexual é basicamente provocada pelo desejo de perturbar, de provocar: "Os fantasmas funcionam, a hostilidade, o mistério, o risco, a ilusão, a vingança, o desejo de apagar ressentimentos e frustrações, a feitichização, sendo que todos esses fatores se encontram ligados por segredos".

"Tentamos fazer de pessoas estranhas nosso bode expiratórios, mas todos, como os analistas, que são depositários de pensamentos eróticos sabem que muitos cidadãos manifestamente 'normais'- e não só os que gostam de vomitar eronicamente, os fornicadores de cabras- são igualmente cheios de ódios e desejos- se não de projetos- todos têm seu mau gosto".

A oferta precisa ser ajustada à demanda- digamos, à expectativa. É a lei do mercado. Certamente, é difícil alimentar fantasias com "um homenzinho redondo e careca". Mas é arriscado, temerário, sonhar apenas com "o homem jovem, bonito, e rico".

As revistas celebram "a amante exigente magnificamente capaz de orgasmos em rajadas sucessivas". Nesses embates, nada de pudores desnecessários.

Oferece-se também conselhos às mulheres para "conservar o amante de uma noite": "Evite beijos grudentos e palavras melosas. Seja o que quer. Brinque de amante. Sonhe. E, finalmente, construa uma verdadeira paixão. Pois o outro não poderá passar sem tais momentos. E, portanto, sem você."

Homossexualidade.

O Relatório Kinsey, quando foi feito, afirmava que "segundo as leis em vigência, 95% dos americanos deviam estar na prisão por crimes sexuais".

Escândalo! Mas um escândalo tranqüilizador: sabendo-se tão numerosos, os "culpados" se sentem inocentes.

Os homossexuais podem agora sair da clandestinidade e afirmar sua normalidade específica.

Visto que os valores e as normas passam a dissociar o ato sexual da reprodução, visto que a busca do orgasmo autoriza a contabilidade dos êxitos alcançados, a prática homossexual se aproxima da heterossexual.

Ao contrário da caricatura de falar alto e fazer gestos exagerados, as imagens míticas mais freqüentes na imprensa homossexual e nas resvistas especializadas são o coubói, o caminhoneiro e o esportista.

O Amor no Casamento

Paixão, fantasias, continência imposta pelo hábito, contato amistoso e silêncio?
Em que momento o leito conjugal é trocado pelas camas separadas, pelos quartos individuais?

Casais vivem décadas juntos, prudentemente adiando certos comentários ou perguntas. Não nos referimos apenas a segredos "utilitários", como o adultério ou fantasias criadas, mas também a questões tão prosaicas como a irritação provocada por roncos, gestos e repetições de histórias contadas- e portanto ouvidas- mais de cem vezes, e a cada vez mais enfeitadas.

E o segredo da mecânica do desejo, e de suas avarias, parece intacto.

O primado do eu sobre o nós conjugal, desvalorizando a constância e a fidelidade em favor da auto-realização das potencialidades pessoais, coloca a existência conjugal em novos termos. Agora não se trata mais de se "instalar" nela, mas de vivê-la sabendo que o outro é uma liberdade capaz de reinvindicar a qualquer momento sua alteridade.

Segredos de Família- Gérard Vincent
História da Vida Privada- Da primeira Guerra aos nossos dias.