sexta-feira, dezembro 21, 2007

Ilustrar, editar, seqüenciar, cortar...

>>> Tudo indica que o poder é algo fluido, deslocante, flutuante, transitório e, acima de tudo, independente do desejo, da manipulação, da administração, do controle dos agentes.

Assim, o poder é algo que, por princípio, não aparece, ou melhor, só aparece em seus efeitos.

Nunca está onde se convenciona situá-lo, como tampouco reduz-se às instituições que buscam fixá-lo, nomeá-lo ou localizá-lo.

>>> O processo é caracterizado por "circulação frenética", e os capitais giram, proliferam, multiplicam-se apenas pelo fato de estarem circulando.

A imagem publicitária, a imagem formada através do trabalho de marketing, de relações públicas orienta-se para a constituição de núcleos genéricos e difusos em torno do nome de empresa.

Trabalhar e receber salário tornam-se componentes místicos do sistema, espécie de ingresso, senha, para poder mesmo "entrar no mundo" do consumo e das mercadorias. O trabalho na era da técnica torna-se uma concessão.

>>> A técnica não só deu conta das aspirações humanas em realizar suas intenções de expansão, exploração e domínio, mas superou-as excepcionalmente.

As crises históricas e os caminhos desastrosos a que conduziram os desenvolvimentos técnicos e as tecnologias, e especialmente as formas de dominação, opressão, violência, genocídios e ameaça planetária puseram em cheque a capacidade da administração racional da sociedade.

Sobreviveram, opostamente, fatos inexplicáveis, imprevisíveis, incontroláveis, inadministráveis, demonstrando que independente ou além de o homem conseguir dar conta da sua realidade, os eventos, acontecimentos, irrupções fogem absolutamente de seu controle e de sua atuação.

>>> A televisão joga com a categoria do tempo operando-o de forma própria e independente dos conceitos cronológicos usuais. É um tempo artificial e manipulado.

É uma forma de liquidificador geral, que mistura as mais diferentes matérias e submete-as todas a um mesmo tipo de tratamento, tornando-as absolutamente inóquoas.

É conhecido o fenômeno de que no Brasil as passeatas não se constituam até a chegada dos cinegrafistas da televisão. Só quando estes põem suas máquinas a postos e começam a filmar é que se compõem os movimentos de protesto, dissolvendo-se logo em seguida, no momento em que as câmeras são desligadas.

O jornalismo já não encontrava mais obstáculos numa prática que se tornou obstinada em vasculhar todos os espaços privados na busca de uma difusão pública, num pretenso interesse da própria sociedade.

Na forma de intercalar notícias sérias com notícias amenas, de jogar com a mágica das cores e do espetáculo, de ilustrar, editar, sequenciar, cortar, introduzir um ritmo de alta velocidade nas cenas que se intercambiam, em todos esses procedimentos puramente formais do processo de comunicação é que se implanta o mecanismo de pasteurização das mensagens.

>>> O efeito é o desaparecimento do outro.
Não se tem mais a necessidade de ser, de falar, de apresentar, de mostrar-se para o outro.
A referência agora é somente o si mesmo.

No mundo fragmentado, a coletividade é o que fascina e o próprio aparecimento do coletivo que é emocionante.

As pessoas vão para assistirem a si mesmas.

Há como que uma humorização geral e trabalha-se tudo sem se levar nada a sério.

>>> A intenção de programar o homem e fazer com que todas as atividades humanas tornem-se passos, estágios de um processamento.

A máquina jamais poderá sentir dor, chorar, sofrer, apaixonar-se, ter reações emocionais, inesperadas, mesmo cínicas, irônicas, pois são fatos que em tempo algum poderão ser representados, codificados, programados, traduzido para uma linguagem técnica dos computadores.

Por outro lado, aquele campo que exatamente Freud buscava ocupar cada vez mais pelas investidas do ego, o emocional-natural, é o que hoje aparece como a fonte única e mais segura para a nova identidade do homem na era eletrônica.

A sociedade Frankenstein- Ciro Marcondes Filho.