quarta-feira, dezembro 05, 2007

Dosá-las.

A paixão é sempre provocada pela presença ou imagem de algo que me leva a reagir, geralmente de improviso. Ela é então o sinal de que eu vivo na dependência permanente do outro.

O estudo dos efeitos que o discurso produz sobre os homens é que faz com que o pathos perca o seu sentido mais amlo de fenômeno passivo para vir a designar as percepções da alma. O objetivo do orador, e, mais ainda, o do poeta, não consiste em apenas convencer através de argumentos. É também necessário que ele toque a mola dos afetos, e utilizem os movimentos que prolongam certas emoções.

Um homem não escolhe suas paixões. Ele não é, então, responsável por elas, mas somente pelo modo como faz com que elas se submetam à suas ação.

As paixões, as possibilidades que temos de dosá-las.

Hegel: "A palavra pathos é de difícil tradução, pois paixão implica algo de insignificante, baixo- como quando dizemos que um homem não deve sucumbir às paixões".
(...) O pathos que os anima pode ser simples, mas nem por isso tem a monotonia de uma idéia fixa. Trata-se antes da tonalidade específica de suas condutas, da tensão que unifica seus atos- sem importar que situações estejam enfrentando.

Há um só meio de evitar as paixões: extirpá-las, impedindo que a emoção se tranforme em uma tendência. Esse é o objetivo da profilaxia estóica. De tanto medir a fragilidade da vida e a precariedade dos bens que não dependem de mim, acabarei por não mais reagir negativamente aos efeitos, permanecendo apático, mesmo aos golpes imprevisíveis do destino.

Essa sabedoria não é equivalente a uma anestesia, como se afirmou algumas vezes, e a apatia não consiste, exatamente, em insensibilidade. "O sábio", diz Crisipo, sofre a dor, mas não é mais tentado por ela: sua alma não se abandona mais a ela.

Ele ainda sente a emoção, mas é suficientemente treinado a ponto de não interpretá-la de maneira fantasiosa, jamais se deixando tragar por ela. Ele é como um ator experiente que permanece sempre distante das peripécias do drama que representa.

Não se trata mais de saber até que ponto é conveniente deixar que suas paixões se extravasem. Seria absurdo pretender controlar a paixão e modular sua força, pois ela é sempre o sintoma de uma doença e não de uma reação inevitável a uma emoção.

"É preciso destruir as paixões": esta é a decisão ingênua que torna danosos a maioria dos ascetismos. Danosos, não por serem "repressivos", mas porque partem da idéia que é impossível viver uma paixão sem ser totalmente dominado por ela.

Nietzsche:"Destruir as paixões e os desejos só por causa de sua tolice e para evitar suas conseqûencias desagradáveis, parece-nos uma manifestação aguda de tolice. Não admiramos mais os dentistas que extraem os dentes para evitar que incomodem mais".

Não consideramos mais as paixões como componentes do caráter de um indivíduo, os quais ele deveria governar, mas como fatores de perturbação do comportamento que ele é incapaz de controlar unicamente através de suas forças.

Apenas uma terapêutica seria então capaz de encontrar a razão disso tudo. Para compreender o que significa esse declínio da idéia de paixão seria necessário pôr o fenômeno em relação com o deslocamento moderno do "eu" e questioná-la quanto à idéia de responsabilidade social.

A medicina ocupa cada vez mais o lugar da ética; a noção de desvio, o do erro; e a cura, o do castigo.

Jule Romains: "Todo homem com saúde é um doente que se ignora".

O conceito de Paixão- Gérard Lebrun.