sábado, agosto 02, 2008

Prouni

Não é de se surpreender que os investimentos públicos sejam os mais baixos da história recente do país e, após as sucessivas privatizações, perderam o papel que tinham como articuladores das condições de crescimento.

O caminho privado de expansão de matrículas, cursos e instituições, que foi tão intenso nos anos de 1970 e teve um novo surto expansivo nos anos de 1990, principalmente entre 1998 e 2002, resultou na criação de um número excessivo de vagas que, segundo informações recentes do INEP, é superior ao número de formandos no ensino médio.

Embora a demanda potencial por ensino superior não se restrinja ao número de concluintes do ensino médio, é muito difícil estimar o número de pleiteantes.
Neste cálculo, inclui-se não apenas parte dos recém-formados, como também aqueles que retornam tardiamente aos bancos escolares.

Este fenômeno dá indícios de que o segmento privado disponibiliza um contingente de vagas não procuradas pelos estudantes.
Esta situação gerou um quadro de incerteza no setor, ainda mais quando se leva em conta o grau de inadimplência/desistência.
A queda nos rendimentos reais e o nível elevado de desemprego dificultam a sustentação dos gastos com as mensalidades pelos assalariados.

Neste contexto, o Programa Universidade para Todos (PROUNI) surge com o discurso de justiça social, tendo como público-alvo os estudantes carentes, cujos critérios de elegibilidade são a renda per capita familiar e o estudo em escolas públicas ou privadas na condição de bolsistas.

Além disso, o programa estabelece, obrigatoriamente, que parte das bolsas deverá ser direcionada a ações afirmativas aos portadores de deficiência e aos negros e indígenas. A formação de professores de ensino básico da rede pública também consta como prioridade.

Tais medidas corroboram com os interesses de parte da sociedade civil, dos movimentos sociais em prol das ações afirmativas, bem como dos egressos do ensino médio público, por não se considerarem uma demanda potencial às instituições públicas frente às barreiras impostas pelos exames vestibulares.

A legitimidade social do programa encontra ressonância na pressão das associações representativas dos interesses do segmento particular, justificada pelo alto grau de vagas ociosas.

O PROUNI surge como excelente oportunidade de fuga para frente para as instituições ameaçadas pelo peso das vagas excessivas.

Não se encontram disponíveis as informações sobre o PROUNI: total de bolsas por IES, a relação total das ies que aderiram ao programa, o detalhamento dos cursos disponíveis e/ou escolhidos, o perfil dos estudantes (dados econômicos e sociais), taxas de evasão e desempenho acadêmico dos beneficiários.

Diante do quadro social e educacional deletérios, cabe questionar a efetividade de tal programa, uma vez que as camadas de baixa renda não necessitam apenas de gratuidade integral ou parcial para estudar, mas de condições que apenas as instituições públicas, ainda, podem oferecer, como: transporte, moradia estudantil, alimentação subsidiada, assistência médica disponível nos hospitais universitários e bolsas de trabalho e pesquisa.

Coerente com a nova lógica das finanças públicas, o diagnóstico do aumento de vagas ociosas - no segmento privado -, combinado à procura por ensino superior das camadas de baixa renda, fundamentou a proposta do MEC de estatização de vagas nas instituições particulares em troca da renúncia fiscal.

As instituições mais beneficiadas parecem ser as lucrativas, que não apenas estão submetidas às regras mais flexíveis, como também obtêm maior ganho relativo em renúncia fiscal, em troca de um número reduzido de bolsas de estudos.

Considerando-se sua legitimidade social, o programa pode trazer o benefício simbólico do diploma àqueles que conseguirem permanecer no sistema e, talvez, uma chance real de ascensão social para poucos que estudaram no seleto grupo de instituições privadas de qualidade.

Mas, para a maioria, cuja porta de entrada encontra-se em estabelecimentos lucrativos e com pouca tradição no setor educacional, o programa pode ser apenas uma ilusão e/ou uma promessa não cumprida.

Cristina Helena Almeida de Carvalho- O Jogo Político em Torno da Educação Superior.