O indivíduo converte-se no centro e no intérprete do mundo.
"É dentro de si que que é preciso olhar o exterior". (Victor Hugo).
Em tempos de ampliação dos movimentos de multidões, o indivíduo afirma-se como valor político, científico, e sobretudo existencial.
A prodigiosa descoberta de si por si próprio gera novos laços com os outros.
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Não menos essencial é a laicização dos procedimentos de interpretação do indivíduo, elaborados à sombra do confessionário.
A compatibilização da existência, a aritmética das horas e dos dias, que sobrecarregam o homem do século XIX, não derivam apenas do temor da falta;
provêm igualmente deste mesmo fantasma da perda que conduz a manter livros de contabilidade doméstica da mais extremada minúcia, que engendra a angústia do desperdício de esperma ou simplesmente do cotidiano estreitamento da duração da vida.
Este desejo de represar a perda transborda para o diário íntimo.
A busca retrospectiva do eu, objeto do diário, estimula arrependimentos, aviva nostalgias, mas, em um mesmo movimento, valoriza a aspiração e desperta o imaginário da construção de si.
O longo monólogo interior permite também que se controle a aparência pessoal, tornando-a ao mesmo tempo mais indecifrável aos outros; o necessário segredo do indivíduo contribui para impor a introspecção.
Desde então ela se preocupa com as roupas, registra os bailes, os espetáculos a que assiste e tem o cuidado de inscrever suas impressões de viagem.
O álbum é um saco de gatos: ali colam-se boletins escolares e gravuras pitorescas; ao chegar o casamento, ele irá unir-se aos cadernos no novo museu dos arquivos familiares.
"Ao conservar a história do que sinto", diz Delacroix em 7 de abril de 1824, "tenho um duplo fim: o passado retornará a mim. O futuro está sempre ali."
Assim se constitui uma memória que autoriza a um só tempo a amnésia e a comemoração.
Bastidores- Alain Courbin.
História da Vida Privada- Da Revolução Francesa à Primeira Guerra.